há tanto tempo que te amo
and i can't make you love me
so i've buried you
between the bars
but i'm so vain
porque também somos o que perdemos
(nothing is mine here
but you)
29 de abril de 2012
25 de abril de 2012
Procuro Ângelo vivo ou morto
(...)
- Ângelo tinha olhos profundos e castanhos. As outras acham graça e caçoam de eu reparar nos olhos e nas mãos dos homens, e não no pau. Mas eu sei falar do pau também. É que com o passar dos anos, aprendi a achar mais interessante mãos do que paus. Gosto de mãos grandes - deu uma tossidinha - acho que quem tem mão grande é mais passional e fode melhor. Talvez isso seja só ilusão minha - deu uma tragadinha - mas a gente tem que é sonhar, né?
Alguns homens já realmente gostaram de mim, e não só dos meus seios ou pernas. Mas eu os recusei. Não aceito que me deem presentem, aqui a coisa é reta, séria. Como uma, como cês chamam? Bolsa de Valores? Leilão? Não, não. É compra e venda mesmo. Quem manda nos meus seios ou pernas - apagou o cigarrinho - sou eu, não quem compra. Ah, então é aluguel, né? Não sei dessas coisas de gente com bufunfa não. Sei do Ângelo.
Eu nem ia me apaixonar por ele não, sabe? Mas aí ele me mostrou um tanto de coisa de gente com bufunfa, eu até tinha entendido um tempo atrás aí o que era Bolsa de Valores. Acho eu boto é fé que Bolsa de Valor é dessas Prada, né? Assim que cês chamam?
Daí o Ângelo tinha uns olhos bonitos, dedos amarelados de tanto fumar. Tinha muita era cultural, bufunfa também, mas ele não dizia assim não. Era solteiro mas tinha uma filha de 20 e tantos anos, quase a minha idade, sabe? Na primeira vez ele disse que me escolheu só porque eu era a que menos parecia sua filha. Não sei se foi bom ou se foi ruim, mas ele fodia olhando nos olhos.
Depois, me oferecia um cigarro - acendeu outro com o isqueirinho - e me contava das viagens ao Paraguai que tinha feito, e das mulheres que tinha se apaixonado. Tinha uma que ele sempre falava, que ele dizia que os peitos eram parecidos com os meus. Eu ria, né? Ninguém gosta de ser comparado, mas ele tava pagando, né? Que que eu posso fazer?
A voz dele era bem grave, e ele tinha calo nas mãos e nos pés. Cravos e pêlos nos peitos e nas costas, e um nariz protuberante. Sorriso também amarelado e dentes separados. Nunca me beijou.
Ah, nunca precisei.
Recitava poesias de Adolfo Bécquer e tinha medo que eu soubesse do final, porque ia estragar a surpresa. Mas ele contava sempre a mesma. Acho que, como as outras, pra fazer graça né? Me caçoar um pouquinho também. Tava pagando, tava no direito - saiu fumaça de seu narizinho.
Ele era homem e olhos castanhos tão tão masculinos que eu me apaixonaria fácil, mas ele nunca me beijou, e eu me apaixono pelo beijo, não pelo pau.
Quando Ângelo ia embora, eu ficava deitada na cama com pouca roupa e ele encostado abotoando a camisa no vão da porta. Foi assim que o vi da última vez, depois sonhei com ele algumas vezes, e.. Mas isso o senhor não quer saber, né, doutor?
Eu sei que vocês gostam de ouvir falar do pau. - e deu um sorrisinho.
- Ângelo tinha olhos profundos e castanhos. As outras acham graça e caçoam de eu reparar nos olhos e nas mãos dos homens, e não no pau. Mas eu sei falar do pau também. É que com o passar dos anos, aprendi a achar mais interessante mãos do que paus. Gosto de mãos grandes - deu uma tossidinha - acho que quem tem mão grande é mais passional e fode melhor. Talvez isso seja só ilusão minha - deu uma tragadinha - mas a gente tem que é sonhar, né?
Alguns homens já realmente gostaram de mim, e não só dos meus seios ou pernas. Mas eu os recusei. Não aceito que me deem presentem, aqui a coisa é reta, séria. Como uma, como cês chamam? Bolsa de Valores? Leilão? Não, não. É compra e venda mesmo. Quem manda nos meus seios ou pernas - apagou o cigarrinho - sou eu, não quem compra. Ah, então é aluguel, né? Não sei dessas coisas de gente com bufunfa não. Sei do Ângelo.
Eu nem ia me apaixonar por ele não, sabe? Mas aí ele me mostrou um tanto de coisa de gente com bufunfa, eu até tinha entendido um tempo atrás aí o que era Bolsa de Valores. Acho eu boto é fé que Bolsa de Valor é dessas Prada, né? Assim que cês chamam?
Daí o Ângelo tinha uns olhos bonitos, dedos amarelados de tanto fumar. Tinha muita era cultural, bufunfa também, mas ele não dizia assim não. Era solteiro mas tinha uma filha de 20 e tantos anos, quase a minha idade, sabe? Na primeira vez ele disse que me escolheu só porque eu era a que menos parecia sua filha. Não sei se foi bom ou se foi ruim, mas ele fodia olhando nos olhos.
Depois, me oferecia um cigarro - acendeu outro com o isqueirinho - e me contava das viagens ao Paraguai que tinha feito, e das mulheres que tinha se apaixonado. Tinha uma que ele sempre falava, que ele dizia que os peitos eram parecidos com os meus. Eu ria, né? Ninguém gosta de ser comparado, mas ele tava pagando, né? Que que eu posso fazer?
A voz dele era bem grave, e ele tinha calo nas mãos e nos pés. Cravos e pêlos nos peitos e nas costas, e um nariz protuberante. Sorriso também amarelado e dentes separados. Nunca me beijou.
Ah, nunca precisei.
Recitava poesias de Adolfo Bécquer e tinha medo que eu soubesse do final, porque ia estragar a surpresa. Mas ele contava sempre a mesma. Acho que, como as outras, pra fazer graça né? Me caçoar um pouquinho também. Tava pagando, tava no direito - saiu fumaça de seu narizinho.
Ele era homem e olhos castanhos tão tão masculinos que eu me apaixonaria fácil, mas ele nunca me beijou, e eu me apaixono pelo beijo, não pelo pau.
Quando Ângelo ia embora, eu ficava deitada na cama com pouca roupa e ele encostado abotoando a camisa no vão da porta. Foi assim que o vi da última vez, depois sonhei com ele algumas vezes, e.. Mas isso o senhor não quer saber, né, doutor?
Eu sei que vocês gostam de ouvir falar do pau. - e deu um sorrisinho.
24 de abril de 2012
Aos caros Levino Ferreira de Alcântara e Thiago Henrique
Hoje fui um dia cheio. Por não ter cumprido certos compromissos, tarefas e ter adiado e desistido de um bocado de coisas, minha cabeça estava tão movimentada quanto a rodoviária.
E é lá que fui parar.
Em direção ao Teatro Nacional para assistir à Orquestra Sinfônica do Teatro Nacional Cláudio Santoro (e, naturalmente esvaziar a mente) peguei o primeiro ônibus que declarava em letras luminosas "ROD. PLAN. PILOTO".
Entrei.
O cobrador, trocador, como você quiser chamar (careca, de uniforme azul e colar de sementes) lia atentamente à Constituição Brasileira.
Chamei atenção "moço", e ele liberou a catraca. Perguntei:
- Constituição?
- É, estou estudando Direito.
Primeira pausa
Lógico que, pelo menos penso eu que, em condições boas de vida e saneamento, ninguém quer ser cobrador. Consequentemente, entendo o esforço do moço careca de uniforme azul e colar de sementes ao estudar Direito.
Nasci, cresci, e espero morrer em condições boas de vida e saneamento. Tão logo, meus parentes (todos os tipos de parentes, exceto meus avós maternos) esperam que eu também faça Direito, se não Medicina ou Engenharia Civil.
Mas para decepção geral nasci, cresci e espero morrer artista.
Expresso meu dom no desenho, no espaço cênico, mas me destaco e domino o campo musical.
Ao ver o moço estudando Direito, me cresce uma pequena e pesada insegurança ao meu futuro. Porque do destino eu só sei que é deitar.
Não quero passar fome, frio e medo. Tampouco decepcionar meus pais. Me dedico pouco ao que penso que nasci para fazer, e às vezes acho tarde demais. Sempre fui corajosa, mas há momentos em que me provo o contrário.
Fim da primeira pausa
- Boa sorte, moço. - e sentei em qualquer lugar.
Chegando ao Teatro Nacional, me dirigi à Sala Villa-Lobos (onde ocorrem rotineiramente às terças-feiras do mês as apresentações da Orquestra) e, Ana sempre atrasada, já tinha começado.
Me deparo com uma big-band tocando Duke Ellington. Coisa mais linda.
Uma fileira de saxofones, outra de trombones e uns três trompetistas. Uma guitarra, piano e bateria.
Ouvi sorrindo.
Quando saíram, entrou a formação normal da Orquestra. Com regência de Emílio de César, interpretaram Scherzo, Alberto Nepomuceno e Carlos Gomes. Entre um grave e outro me emocionava, ao ponto da moça ao lado perguntar se eu estava bem. E é lógico que eu estava. Nunca estive melhor.
Estava presenciando o que quero presenciar para sempre: o preencher da música na sala e nos sete buracos da minha cabeça.
Preencher não: inundar.
Acabaram, o público aplaudiu de pé, assobiou e gritou. O homenageado da noite - maestro Levino Ferreira de Alcântara - foi convidado a subir no palco e reger algumas peças de Mozart e outra de Haendel, com a participação do Coro Cantus Firmus. Impecável, diria.
Mas não foi a estrutura nem a escolha das músicas que me chamou atenção.
Segunda pausa
Nesta noite, Levino Ferreira de Alcântara comemora 90 anos, completados no dia 3 de abril. Construiu e fundou a Escola de Música de Brasília.
Construiu e fundou minha segunda casa.
Não dei valor quando estive lá. De fora você percebe e se chateia com os maus tratos do Governo em relação à Escola de Música. Mas isso não convém.
Levino, de cabeça branca e passos curtos esbanja lucidez e clareza nas suas palavras. Proferiu poucas e completas palavras, e com senso de humor, agradeceu por estar ali.
Mas seus gestos... Ah, seus gestos.
Que gestos.
Demonstravam uma vida inteira difícil e satisfatória. Seus gestos - de maestro, como ficar na ponta do pé e erguer os braços ao tentar chegar nos agudos dos violinos - expressavam (arrisco dizer e espero que concorde e esteja certa) amor.
Gestos não tão rápidos quanto a orquestra tocava. Mas gestos vívidos, gigantes e admiráveis.
Emocionei-me, a moça do lado - até que enfim - se emocionou.
Fim da segunda pausa
Parabéns finais, o público se retira.
Permaneço em meu lugar agradecendo silenciosamente a certeza obtida nesta noite.
Música.
Observações pequenas
Impressionei-me com toda a interpretação e esforço da Orquestra. Mas aviso que não é a primeira vez que a vejo.
Tão logo, sempre me impressiono. E por me impressionar sempre, tenho certeza.
Certeza essa que talvez me faça passar fome e frio. Mas medo já não mais.
E certeza de que com esforço, dedicação e carinho chego aos pés (nem que seja a sola dos pés) do maestro Levino Ferreira de Alcântara.
A traduzirei agora em escalas.
E é lá que fui parar.
Em direção ao Teatro Nacional para assistir à Orquestra Sinfônica do Teatro Nacional Cláudio Santoro (e, naturalmente esvaziar a mente) peguei o primeiro ônibus que declarava em letras luminosas "ROD. PLAN. PILOTO".
Entrei.
O cobrador, trocador, como você quiser chamar (careca, de uniforme azul e colar de sementes) lia atentamente à Constituição Brasileira.
Chamei atenção "moço", e ele liberou a catraca. Perguntei:
- Constituição?
- É, estou estudando Direito.
Primeira pausa
Lógico que, pelo menos penso eu que, em condições boas de vida e saneamento, ninguém quer ser cobrador. Consequentemente, entendo o esforço do moço careca de uniforme azul e colar de sementes ao estudar Direito.
Nasci, cresci, e espero morrer em condições boas de vida e saneamento. Tão logo, meus parentes (todos os tipos de parentes, exceto meus avós maternos) esperam que eu também faça Direito, se não Medicina ou Engenharia Civil.
Mas para decepção geral nasci, cresci e espero morrer artista.
Expresso meu dom no desenho, no espaço cênico, mas me destaco e domino o campo musical.
Ao ver o moço estudando Direito, me cresce uma pequena e pesada insegurança ao meu futuro. Porque do destino eu só sei que é deitar.
Não quero passar fome, frio e medo. Tampouco decepcionar meus pais. Me dedico pouco ao que penso que nasci para fazer, e às vezes acho tarde demais. Sempre fui corajosa, mas há momentos em que me provo o contrário.
Fim da primeira pausa
- Boa sorte, moço. - e sentei em qualquer lugar.
Chegando ao Teatro Nacional, me dirigi à Sala Villa-Lobos (onde ocorrem rotineiramente às terças-feiras do mês as apresentações da Orquestra) e, Ana sempre atrasada, já tinha começado.
Me deparo com uma big-band tocando Duke Ellington. Coisa mais linda.
Uma fileira de saxofones, outra de trombones e uns três trompetistas. Uma guitarra, piano e bateria.
Ouvi sorrindo.
Quando saíram, entrou a formação normal da Orquestra. Com regência de Emílio de César, interpretaram Scherzo, Alberto Nepomuceno e Carlos Gomes. Entre um grave e outro me emocionava, ao ponto da moça ao lado perguntar se eu estava bem. E é lógico que eu estava. Nunca estive melhor.
Estava presenciando o que quero presenciar para sempre: o preencher da música na sala e nos sete buracos da minha cabeça.
Preencher não: inundar.
Acabaram, o público aplaudiu de pé, assobiou e gritou. O homenageado da noite - maestro Levino Ferreira de Alcântara - foi convidado a subir no palco e reger algumas peças de Mozart e outra de Haendel, com a participação do Coro Cantus Firmus. Impecável, diria.
Mas não foi a estrutura nem a escolha das músicas que me chamou atenção.
Segunda pausa
Nesta noite, Levino Ferreira de Alcântara comemora 90 anos, completados no dia 3 de abril. Construiu e fundou a Escola de Música de Brasília.
Construiu e fundou minha segunda casa.
Não dei valor quando estive lá. De fora você percebe e se chateia com os maus tratos do Governo em relação à Escola de Música. Mas isso não convém.
Levino, de cabeça branca e passos curtos esbanja lucidez e clareza nas suas palavras. Proferiu poucas e completas palavras, e com senso de humor, agradeceu por estar ali.
Mas seus gestos... Ah, seus gestos.
Que gestos.
Demonstravam uma vida inteira difícil e satisfatória. Seus gestos - de maestro, como ficar na ponta do pé e erguer os braços ao tentar chegar nos agudos dos violinos - expressavam (arrisco dizer e espero que concorde e esteja certa) amor.
Gestos não tão rápidos quanto a orquestra tocava. Mas gestos vívidos, gigantes e admiráveis.
Emocionei-me, a moça do lado - até que enfim - se emocionou.
Fim da segunda pausa
Parabéns finais, o público se retira.
Permaneço em meu lugar agradecendo silenciosamente a certeza obtida nesta noite.
Música.
Observações pequenas
Impressionei-me com toda a interpretação e esforço da Orquestra. Mas aviso que não é a primeira vez que a vejo.
Tão logo, sempre me impressiono. E por me impressionar sempre, tenho certeza.
Certeza essa que talvez me faça passar fome e frio. Mas medo já não mais.
E certeza de que com esforço, dedicação e carinho chego aos pés (nem que seja a sola dos pés) do maestro Levino Ferreira de Alcântara.
A traduzirei agora em escalas.
22 de abril de 2012
amazônia
das terras não conhecidas
você escolheu a minha
devastou lençóis
roubou sorrisos
arrancou beijos
fez ventos.
das terras menos conhecidas
você inundou a minha
gritei
evitei
impedi
mas quem luta com mão
perde contra quem luta com faca
quem luta com os lábios
perde contra quem luta com dedos
quem luta
perde.
das terras devastadas
você retornou à minha
emprestei o que era teu
doei o que era meu
esqueci o que foi nosso.
você escolheu a minha
devastou lençóis
roubou sorrisos
arrancou beijos
fez ventos.
das terras menos conhecidas
você inundou a minha
gritei
evitei
impedi
mas quem luta com mão
perde contra quem luta com faca
quem luta com os lábios
perde contra quem luta com dedos
quem luta
perde.
das terras devastadas
você retornou à minha
emprestei o que era teu
doei o que era meu
esqueci o que foi nosso.
21 de abril de 2012
16 de abril de 2012
15 de abril de 2012
pessoal (parte 1)
Acordei naquela manhã com frio. Demorei pra levantar. Não sou desses, preguiçosos. Não espero a vida acontecer, tampouco deixo que outras pessoas a dominem. Logo, estranhei quando não quis levantar.
Fazia 5 anos que meu irmão tinha desparecido, naquele dia, naquela manhã. Nunca me importei.Quando disse que não ia criar drogado em casa eu tinha falado sério. Pelo visto, ele não teve futuro mesmo. Tentou voltar uma vez mas eu não deixei. Repito: nunca me importei. Meus pais - covardes em não aceitar a realidade - nunca se importaram, por que eu, mero irmão mais velho me importaria? Tentei criá-lo. Desisti em pouco tempo. Não tinha me criado, queria criar outro - que não queria ajuda? Quem sou eu para fazê-lo?
Ah, voltemos à manhã.
Quando consegui levantar fui ao banheiro, como ritual, de praxe, usual, então. A barba já tinha crescido mais um tanto, e eu não iria fazê-la. Minha nêga disse que gosta assim, deixa, né? Tem que agradar a mulher às vezes. Ela passa aquela coisa toda na cara pra ficar bonita pra mim, eu deixo a barba crescer, assim que as coisas têm que ser; recíprocas.
Aí lembrei dela e dei um sorriso. Sem mostrar os dentes, de ressaca, mas sorri. Tava feliz, sabe?
Lavei o rosto, escovei os dentes, e desejei algum desses trecos que as nêgas passam pra esconder olheira.
Nem tomei café, nem dei beijo na mãe, fui pra rua.
Estava frio, e consequentemente, nublado. Fiquei extasiado em sentir o vento no meu rosto, e pensei seriamente em voltar pra casa, fazer a barba só pra passar pós-barba na cara e sentir o vento de novo.
Fui pegar o ônibus e logo esse vento passou.
Abafado. Ia chover, então fecham as janelas do inferno. É homem encostando em quem não conhece, mulher com três bolsas e menino no colo, você deve saber. E eu lá. De casaco e documento na mão. Ia pagar umas contas no banco, mas estava quase desistindo. Primeiro por este inferno, segundo porque estavam atrasadas e eu estava duro. Talvez se atrasasse mais eu conseguisse juntar um dinheirinho bom, e com o que sobrar, eu ia pedir a nega em casamento. Quase, pra variar. Eu quase isso, quase aquilo, mas nunca.
Aí enfim desci.
Muita gente na rua. Admiro essas pessoas que acordam cedo e lembro sempre do meu irmão que reclamava de fazer o mesmo. Ele acordava cedo para ir ao colégio, e não para pegar no batente. Não precisava daquele escândalo todo que ele fazia. Só de lembrar o sangue ferve.
Mimado de merda.
Fechei a cara ao lembrar. Várias pessoas passaram por mim nesse momento, mas um me chamou atenção. Era careca, de óculos escuros e sapatos caros. "Mais um desses charlatões", pensei.
Continuei andando, agora com passos acelerados. Parei num quiosque para comprar Coca-Cola, mas nem isso tinha. Continuei andando como tivera feito a vida inteira.
Quando parei para atravessar o sinal, alguém encostou a mão no meu ombro.
Virei preparado para dar um sorriso ou um soco.
Quando virei, pensei em dar a segunda opção.
Era o tal do homem charlatão.
O sinal abriu, e eu dei um passo. Ele foi direto:
- Você sabe bater? - e eu continuei andando, sem parar. - Você sabe bater, imbecil? - ele repetiu. Fechei a cara novamente. Sabia que não devia ter saído de casa, sabia. Dei meia volta e o sinal fechou. Cheguei perto dele e, pacientemente, perguntei
- O que você disse?
- Não me faça repetir.
- Foi isso mesmo que eu entendi - e virei as costas maaais uma vez. Ele colocou a mão no meu outro ombro e eu virei um tanto bufante - O que você quer?!
- Você sabe bater?
- Sei.
- Me mostra.
Ri.
Ridículo. Agora ele queria fazer ceninha ali, no sinal? Com várias pessoas em volta?
- Não me dou a esse luxo não, doutor. Com licença que eu tenho coisas a fazer.
E me deu um soco. No queixo.
Doeu.
Dor que há muito não sentia.
Revidei.
No olho.
As pessoas olharam, um cara se aproximou para nos separar, mas o charlatão afastou-o dizendo que estava tudo bem. E eu já não entendia mais era nada. Queria voltar pra minha cama, tava bom lá.
- Ah, que que foi agora? - eu perguntei
- Você é bom, moleque
- Tá, posso ir? Caralho! Agora além de ter que pagar conta vou ter que consertar meu queixo. Vá procurar o que fazer, infeliz!
- De quanto é essa sua conta?
- O quê?
- Qual o valor da sua conta?
- Oras, não se meta na minha vida, velhaco!
- Eu pago sua conta.
- Não preciso. - atravessei finalmente o sinal e ele atravessou junto.
- Precisa sim. Você tem cara de quem precisa. Mas eu também preciso. Preciso de alguém que soque como você.
- Tem academia de boxe aqui perto, doutor. Procura lá.
- EU PAGO SUA CONTA, IMBECIL. Ainda sobra dinheiro extra. É pra coisa SÉRIA que eu preciso de você, não se recusa coisa séria, é quase uma caridade, um serviço de solidariedade, aceita e me escuta, porra! Gostei de você quando fechaste a cara há alguns minutos atrás.
Não foi à toa, porra.
Me escuta e aceita.
- Não aceito e te escuto, diz.
- Te pago bem. Sou dono de consórcio, tem minha palavra. Quero me vingar de uma mulherzinha. Uma vagabunda, na verdade.
- Como assim?
- Você enche ela de porrada - ele abaixou o tom de voz - mas só até o nariz dela sangrar. Não desmaia nem mata. Tá me ouvindo? Não desmaia nem mata. Só pra dar um susto na vagabunda.
- Cê ta brincando que eu vou bater em mulher por dinheiro, né? Dá licença, meu senhor, dá licença.
- Eu pago o que você quiser, criança. Eu tô precisando, cacete. E tu? Tá precisando do que?
- De ir. De pagar minhas contas, fechar meu queixo.
- Tu não tem mulher?
- Tenho sim, doutor.
- Tu não quer dar nem uma joiazinha pra ela?
Fiquei em silêncio.
Aquilo era corrupção. A gente sabe que em mulher não se bate.
Mas toca no assunto do coração e do bolso a gente até pensa.
Até.
- Quero sim.
- Então.
- Mas com o meu dinheiro.
- O dinheiro vai ser seu, mula! Te dou quanto for necessário. Só quero uns socos. Você não estará sozinho.
- Tá.
- Aceita?
- Quero ver qual é.
13 de abril de 2012
Tyler
Quebrei-lhe a face (de novo).
Deixei roxa, azul e verde.
Dolorida, fraquejou.
Pra combinar com o caráter.
Deixei roxa, azul e verde.
Dolorida, fraquejou.
Pra combinar com o caráter.
12 de abril de 2012
10 de abril de 2012
Mamãe que nos faz (2010)
Antes que você, precipitado, pudesse cometer algum erro eu já estava lá, consertando-o. Foi assim que fui parar em sua casa, mal decorada, com móveis e eletrodomésticos simples.
Minha mãe sempre dissera para escolher um homem com uma casa bem decorada: homem que cuida da casa, cuida da mulher que tem. Mas talvez eu pudera provar para dona minha mãe que exceções existem.
Cê tava encostado no vão da porta de uma forma tão bonita que eu não resisti. Levantei da cama, abri a bolsa manchada de chuva e tirei a câmera que sobrevivera.
Voltei à cama e fotografei. Brincando, fez algumas poses que ficariam bonitas no preto e branco - e ficaram.
Pedi que tirasse a camisa, e foi o que fez. Lentamente, mexendo os quadris, brincando, para variar.
Minha mãe sempre dissera que homens que brincam tendem a levar a felicidade mais a sério. Ah, é a única coisa que devemos levar a sério.
Mas como nunca levo nada a sério tampouco ao pé da letra, o que tentei a sério levar naquele momento foi teu abdome não definido, com pêlo e saúde.
Desliguei a câmera e pisquei o olho, convidando-te.
Aceitara tão rápido que quase estranhei.
Quase.
É engraçado como a gente se ajeita fácil em cama pequena. Acho que se ela fosse maior, ficaríamos desconfortáveis. "Mas que injustiça!" disse com voz fraca ao perceber que eu estava de camisa; e você já não mais.
"Arranca!"
Ordenava eu, obedecia você ainda que não submisso. Porque quando cansava de ouvir, me calava a boca com longo encostar de beiços, lábios, língua e sorrisos.
Mãe que dizia que quem sorri, vive mais.
Viveríamos muito, então.
Quando, cansado, encostava no teu peito e - novamente - brincava com teu cabelo
Suspirava e me vinha certeza
"Mamãe mandou eu escolher esse daqui".
Mas como eu sou teimosa vou escolher esse daqui.
Minha mãe sempre dissera para escolher um homem com uma casa bem decorada: homem que cuida da casa, cuida da mulher que tem. Mas talvez eu pudera provar para dona minha mãe que exceções existem.
Cê tava encostado no vão da porta de uma forma tão bonita que eu não resisti. Levantei da cama, abri a bolsa manchada de chuva e tirei a câmera que sobrevivera.
Voltei à cama e fotografei. Brincando, fez algumas poses que ficariam bonitas no preto e branco - e ficaram.
Pedi que tirasse a camisa, e foi o que fez. Lentamente, mexendo os quadris, brincando, para variar.
Minha mãe sempre dissera que homens que brincam tendem a levar a felicidade mais a sério. Ah, é a única coisa que devemos levar a sério.
Mas como nunca levo nada a sério tampouco ao pé da letra, o que tentei a sério levar naquele momento foi teu abdome não definido, com pêlo e saúde.
Desliguei a câmera e pisquei o olho, convidando-te.
Aceitara tão rápido que quase estranhei.
Quase.
É engraçado como a gente se ajeita fácil em cama pequena. Acho que se ela fosse maior, ficaríamos desconfortáveis. "Mas que injustiça!" disse com voz fraca ao perceber que eu estava de camisa; e você já não mais.
"Arranca!"
Ordenava eu, obedecia você ainda que não submisso. Porque quando cansava de ouvir, me calava a boca com longo encostar de beiços, lábios, língua e sorrisos.
Mãe que dizia que quem sorri, vive mais.
Viveríamos muito, então.
Quando, cansado, encostava no teu peito e - novamente - brincava com teu cabelo
Suspirava e me vinha certeza
"Mamãe mandou eu escolher esse daqui".
Mas como eu sou teimosa vou escolher esse daqui.
4 de abril de 2012
(yuri)
(tentando
tentando
tentando
tentando
teamando
tentando
tentando
tentando
vocêassim
tentando
tentando
tentando
tentando
tentando
tentando
tentando
tentando
tentando
fim)
tentando
tentando
tentando
teamando
tentando
tentando
tentando
vocêassim
tentando
tentando
tentando
tentando
tentando
tentando
tentando
tentando
tentando
fim)
3 de abril de 2012
O cheiro de menta e pipoca que dá quando a gente ama (parte 1)
Era domingo, desses que a gente come macarrão até não conseguir mais, mas deixa espaço pro sorvete de tapioca como sobremesa.
Lola comentou assim que terminou sua última garfada "amanhã eu começo minha dieta".
Fernandinho riu para dentro e continuou a comer.
- O que você está insinuando hein, criatura? - já foi ameaçando a gordinha ruiva que era Lola, sem nem pensar - Não acha que eu sou capaz?
- É que é a décima quinta vez que você fala isso, meu pãozinho-de-ló.
- E daí?
- Você é capaz sim, minha batatinha recheada.
- Pois se fui capaz de dormir com você, sou capaz de fazer uma dieta e emagrecer. Vou ficar linda, e a minha história vai aparecer nas capas das revistas. Aí, quando você for sábado de manhã comprar o pão (que vai ser integral) e jornal, vai me ver na capa da revista.
- Vou sim, docinho.
Os dois continuaram comer, e Fernandinho como de praxe, guardou suas opiniõezinhas para si. Afinal, expô-las seria muito risco.
Os dois adormeceram e o sol logo anunciava uma segunda-feira daquelas.
Lola comentou assim que terminou sua última garfada "amanhã eu começo minha dieta".
Fernandinho riu para dentro e continuou a comer.
- O que você está insinuando hein, criatura? - já foi ameaçando a gordinha ruiva que era Lola, sem nem pensar - Não acha que eu sou capaz?
- É que é a décima quinta vez que você fala isso, meu pãozinho-de-ló.
- E daí?
- Você é capaz sim, minha batatinha recheada.
- Pois se fui capaz de dormir com você, sou capaz de fazer uma dieta e emagrecer. Vou ficar linda, e a minha história vai aparecer nas capas das revistas. Aí, quando você for sábado de manhã comprar o pão (que vai ser integral) e jornal, vai me ver na capa da revista.
- Vou sim, docinho.
Os dois continuaram comer, e Fernandinho como de praxe, guardou suas opiniõezinhas para si. Afinal, expô-las seria muito risco.
Os dois adormeceram e o sol logo anunciava uma segunda-feira daquelas.