19 de abril de 2013

Anadotas de quem é sincero

I

Estava eu chegando em casa depois de um exaustivo dia. Por estar saindo do estúdio, carregava meu violão num case enorme e alguns cabos que não cabiam na mochila. De chinelo, short e toda suada, passo na frente de um bar. Um senhor beberrão grita:
- Nossa, você toca? Eu também toco, vamos tocar juntos!

Nem ouso olhar para o sujeito e continuo andando. Atravesso a comercial e vejo já o meu prédio.
Um homem passa por mim e diz, aleatoriamente:
- Eu também toco! Mas toco de ouvido, não precisei de aula com professor não.
- Poxa, cara, que bacana! Me ensina! - respondi sorrindo, meio sem graça.
- Quem sabe um dia...! - proferiu o rapaz, sem parar de andar.

Chego, enfim, na última rua para chegar à minha casa.
Num dos bancos que ficam em frente ao bloco, estava sentada uma senhora que está sempre bem arrumada e passeando pela quadra, com jóias. Há anos ela faz a mesma coisa todos os dias. Morei fora, voltei, e ela continua lá. Finíssima.
Durante toda minha infância pensei que ela esperasse alguém. Mas hoje acho que ela quer arrumar um namorado.
Passei na frente do banco suando mais do que suei o dia inteiro. Desesperada para chegar em casa.
- Psiu! - a senhora me chama - Ei, psiu!
- Oi? - olho para senhora sem muita expectativa.
- Você toca violão?
- Toco sim.
- Acho lindo mulher que toca violão. Lindo.
- Obrigada, poxa. - disse, sem graça (porque não sei receber elogios, desta vez).
- Espero que continue tocando até o resto de sua vida, minha filha. Assim você terá todos os homens na sua mão.
- Obrigada, obrigada! - sorri grande.

Tomara, minha senhora.
Tomara.


II

Sexta-feira. Entrei no ônibus e percebi que estava cheio de rapazes bonitos. Mas sem muita expectativa, sentei na frente de um deles.
Distraía-me com a W3 sul quando o rapaz que estava atrás de mim me cutuca:
- Nossa, moça, qual é o nome do seu perfume?
- Putz, sabe que eu não sei?! Mas é um nacional, da Boticário, eu acho.
- Sério? É tão bom, adorei. Na verdade é tão bom que parece importado.
Ri mas fiquei reticente. Agradeci o elogio e virei para frente.
Escuto de supetão, baixinho, uns outros rapazes atrás dele comentarem:
"Nossa, que bicho burro! Pergunta o nome do perfume mas não pergunta o nome da menina".

Ri.


III

Fui comprar pão de manhãzinha na padaria perto de casa. Na fila, sedo o lugar para uma idosa de cabelos brancos e chinelo confortável de pano.
Olhando para minha tatuagem na coxa, a dona pergunta:
- Olha, isso daí não doeu não?
- Hein? - pedi que repetisse
- Isso daí, esse negócio aí na sua perna. O que é?
- Ah, é uma caravela. - levantei um pouco do short para que ela pudesse ver melhor. - Vê?
- Ah, tá. E esse negócio aí não doeu não?
- Olha, doer doeu. Mas é totalmente aguentável e eu n...
- ... Credo, Deus me livre. - fui interrompida - Essa juventude tá toda bagunçada.
E a senhora vira pra frente, prestes a ser atendida.
Pede alguns pães e eu volto ao jornal que estava lendo antes disto tudo começar.
Ela pega os pães e antes de sair dá uma última olhada na minha tatuagem. Faz uma cara de desgosto e conclui:
- Mas se te faz feliz, né?
E sai andando em passos apertados.




Mas se te faz feliz.
Então continue fazendo.

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Ahá.