10 de novembro de 2010

Deixa pra amanhã

Você deve saber: adiar um sonho não é uma coisa fácil. Parece até fácil. Mas dói.
A dor de adiar um sonho sempre vai ser menor do que parece. Mas quando seu coração está no chão, todo drama é perdoável.

Era uma fila enorme.
Cheguei lá uma hora antes de abrirem as inscrições, e, Deus, que fila enorme. Vários jovens e senhores sentados no chão. Sentei atrás de um rapaz bonito de dreads, e olhei para o teto rezando (mesmo que de certa forma) para o tempo passar mais rápido, para algumas pessoas desistirem.
Mas eu esqueci de rezar para ter vaga.
E isso não importou na hora. O rapaz de dreads olhou para trás e sorriu:
- Qual é o seu instrumento preferido?
- Violoncelo. - bem assim. Com um ponto final tão visível que pesou na resposta.
- Nossa, que legal! - espontâneo - O meu é o saxofone.
- Gosto de saxofone.
- Gosto de violoncelo.
E quando ele respondeu isso, sorriu como da primeira vez já se levantando:
- Bem, violoncelista, tenho coisas a fazer. Quando eu chegar lá, não vai ter mais vaga para inscrever. Prazer, hein.
- Se cuida.
Parecíamos íntimos.
De uma forma ou outra, música intima quais quer seres que a sintam. E tenho certeza que todos naquela fila eram íntimos.
Sonhar intima também.
Junte os dois. Talvez, quando você conseguir realizar o seu sonho sobre a música, seja como um orgasmo. Mas isso não convém (agora).
Sentada, me rastejei um azulejo grande para a frente. E começou a chover.
Estava de jeans e camiseta, sem casaco, com uma bolsa verde e esperando algum milagre.
Alguma piedade.
E talvez aquela força do destino.
Sabe como é, hoje é quarta, hoje eu acredito em Deus.

E então meu telefone toca:
- Oi, Ana.
- Oi.
- Lembra de mim?
- Não esqueceria sua voz.
- Tá ocupada?
- Não.
- Estou na W3 sul, no mesmo lugar de sempre. Me encontra.
E desligou.
Tão tentador quanto violoncelo.
E tão irritante quanto o tempo.
Não sei quanto tempo não o ouvia. O via. Sem dúvidas, eram saudades daquelas que corroem, mas a fila estava enorme e eu tinha um propósito.
Passei as duas últimas semanas estudando teoria musical para uma prova que, depois de eu ter saído daquele prédio baixo, de tijolos e sinfonias, eu nem vou chegar a fazer.

Provavelmente, alguém pegou a minha vaga.
Sonhos, destino, e principalmente a sorte são coisas injustas.
E que assim sejam: sacríficios e deixar para a semana que vem faz parte da vida de quem se apaixona.

Pela música;
Pela chuva;
Pelos objetivos;
E pelos outros.

3 comentários:

Ivan Pacheco disse...

Deveras angustiante.
Acostuma-te a agir conforme a racionalidade da situação concreta, recheada de acidentalidades.

' disse...

Um dia você me disse algo do tipo: "vai no necessário-interesse, depois pro resto. Tenho que ir."

Ai você foi.

Paulo Angione disse...

Lindo, perfeito, profundo como uma orquestra, que no final rapidamente a luz se apagou, sendo que estar correndo ligeiramente para acendê-La. (Você é FODA! E sei que isso não te abalará) A vitoria não é somente ela dita, tem que conquistar, batalhar ter perseverança mais do que já teve.Sei que a vitoria vós procurais.

Postar um comentário

Ahá.